TJ de SC mantém pena a vigilante por injúria homofóbica   

Vamos lembrar que Injúria Homofóbica é Crime desde 2019 e, definitivamente, reconhecida como espécie de racismo desde 2023:

A 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a condenação de um vigilante pelos crimes de injúria qualificada por preconceito homofóbico e ameaça, em Florianópolis. O agente público municipal foi sentenciado às penas de um ano de reclusão e um mês de detenção, ambas em regime aberto, além do pagamento de 10 dias-multa.

As penas privativas de liberdade foram substituídas por duas restritivas de direito – prestação pecuniária de um salário mínimo à vítima e prestação de serviços à comunidade na razão de uma hora de tarefa por dia de condenação. A defesa do acusado não conseguiu comprovar o “direito de retorsão”.

Segundo a denúncia do Ministério Público, em outubro de 2020, o acusado percebeu que o veículo da vítima tinha adesivos de um partido político de esquerda e em favor da causa LGBT+. O vigilante encostou o carro ao lado, quando o semáforo estava fechado, e passou a ofender a vítima com termos homofóbicos. O acusado ainda fez as seguintes ameaças: “cuidado para não tomar um tiro na cara” e “vocês merecem morrer”.

Inconformado com a sentença, o agente público municipal recorreu ao TJSC. Requereu a nulidade do processo pela ausência de intimação de uma das testemunhas de defesa e a decadência do direito de representação. Invocou também o instituto da retorsão e clamou pela extinção da punibilidade pelo perdão judicial. De acordo com o artigo 140 do Código Penal, “o juiz pode deixar de aplicar a pena no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria”.

“Não há em momento algum nos autos provas efetivas de que houve reciprocidade nas ofensas. Pelo contrário, não satisfeito com os xingamentos e ameaças iniciais, o réu ainda foi atrás do veículo onde estava a vítima (no semáforo seguinte) e mais uma vez passou a ofendê-la conforme explicitado pelo vídeo juntado aos autos. Destarte, inviável o reconhecimento da retorsão e, via de consequência, o acolhimento do pleito absolutório”, anotou o relator em seu voto. A decisão foi unânime (Apelação Criminal n. 5062604-62.2021.8.24.0023/SC).

Fonte: TJSC.

Decisão Crucial no STF: Liberdade Religiosa Vs. SUS

Neste vídeo, mergulhamos fundo em um caso de grande repercussão que está nas mãos do Supremo Tribunal Federal (STF). Trata-se de uma decisão crucial que coloca em pauta a liberdade religiosa versus a saúde pública. No centro do debate está a obrigação dos entes federados em relação à liberdade religiosa dos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) e a incorporação de tratamentos sem transfusão de sangue, especialmente no caso das Testemunhas de Jeová. A Procuradoria-Geral da República expressou sua posição sobre o assunto…

Este é um tema complexo que envolve direitos individuais, políticas de saúde pública e recursos escassos.

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Antony, jogador do Manchester: fotos e áudios inéditos revelam agressões contra ex-namorada, diz site

Lá em 2020 eu já falava sobre como o futebol tende a proteger acusados de agressão a mulheres:

Um dos vídeos mostra lesão grave nos dedos da mão da DJ

O atacante Antony, que atualmente joga no Manchester United e recentemente foi convocado pela seleção brasileira, está sob investigação da Justiça de São Paulo devido a acusações de violência doméstica contra sua ex-namorada, a DJ e influencer Gabriela Cavallin. De acordo com informações obtidas pelo UOL, há fotos, vídeos, conversas e depoimentos de testemunhas que estão sendo analisados no inquérito.

O que você precisa saber:

  • Antony, jogador de 23 anos, é acusado de agressões físicas, ameaças e intimidações;
  • Fotos, vídeos e depoimentos de testemunhas foram apresentados como provas no inquérito;
  • Ex-namorada registrou uma segunda denúncia contra Antony na polícia de Manchester.

Os registros obtidos pelo portal revelam ameaças, intimidações e agressões físicas cometidas pelo jogador, que recentemente participou da Copa de 2022 e é um dos destaques da última convocação da seleção brasileira. Ainda de acordo com a apuração do UOL, a DJ registrou uma segunda denúncia contra Antony, desta vez na polícia de Manchester, na Inglaterra, na última sexta-feira (1).ReproduçãoReprodução

Um dos vídeos do inquérito ao qual o UOL teve acesso mostra uma lesão grave em que os ossos dos dedos da mão de Gabriela Cavallin ficam expostos. Esta teria sido a última agressão cometida pelo atleta, segundo depoimento da influencer. Ao ser procurado pela reportagem, Antony optou por não comentar sobre as acusações. A assessoria do jogador informou que o caso está em segredo de Justiça e será tratado oficialmente.ReproduçãoReprodução

O UOL também questionou a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o treinador Fernando Diniz a respeito da decisão de convocar o jogador para a primeira rodada das eliminatórias da Copa de 2026. No entanto, ambos não se manifestaram sobre o assunto. De acordo com a apuração do portal, foi apurado que a seleção não tinha conhecimento do processo e seus detalhes, e tomou a decisão de convocar o jogador com base em reportagens publicadas em junho. Enquanto isso, o atacante continua atuando normalmente na Inglaterra, sem que nenhuma medida preventiva tenha sido adotada pelo Manchester United.

fonte aqui.

Unaids: Brasil cumpre 1 das 3 metas da ONU para fim da epidemia de aids

Em 2019, no meu Estágio Pós-doutoral no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto eu já mostrava essa tendência preocupante da queda das políticas de prevenção/tratamento do HIV no Brasil:

A pesquisa foi transformada em e-book de acesso gratuito (aqui).

95% das pessoas com HIV em tratamento estão com a carga viral indetectável

O Brasil atingiu 1 das 3 metas globais propostas pelo Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids) para que a aids deixe de ser uma ameaça à saúde pública até 2030 e ainda patina na redução das várias desigualdades que marcam a epidemia.

Até o momento, 91% dos 990 mil brasileiros vivendo com HIV no país conhecem seu diagnóstico. Desses, 81% estão em tratamento e, entre eles, 95% estão com a carga viral suprimida. A meta do Unaids é de 95% para cada uma das situações. Em 2022, o país registrou 51 mil novos casos de HIV e 13 mil mortes.

Os dados constam em um novo relatório global sobre Aids divulgado pelo Unaids nesta quinta (13), em Genebra, Suíça.

Segundo Winnie Byanyima, diretora-executiva do Unaids, as respostas ao HIV têm sucesso quando estão baseadas em uma liderança política que segue as evidências, enfrenta as desigualdades, fortalece organizações da sociedade civil e garante financiamento suficiente e sustentável.

Países como Botsuana, Essuatíni, Ruanda, República Unida da Tanzânia e Zimbábue já alcançaram as metas de 95-95-95, e pelo menos outros 16 países (incluindo oito na África subsaariana) estão próximos de fazê-lo, de acordo com o documento.

No mundo, a aids ceifou uma vida por minuto em 2022. As novas infecções por HIV não estão diminuindo rápido o suficiente, e milhões de pessoas ainda são privadas de tratamento, incluindo 43% das crianças. Hoje, há 39 milhões de pessoas vivendo com HIV —cerca de 9,2 milhões ainda sem tratamento e 2,1 milhões em tratamento, mas sem carga viral suprimida.

“O caminho que põe fim à Aids requer colaboração entre o Sul e o Norte globais, governos e comunidades, ONU e estados-membros atuando conjuntamente. Exige uma liderança corajosa. O mapa apresentado neste relatório mostra como o sucesso é possível nesta década, mas apenas se avançarmos juntos e com sentido de urgência”, reforçou Winnie.

Testagem

De acordo com Ariadne Ribeiro, oficial de igualdades e direitos do Unaids no Brasil, para avançar no cumprimento da primeira meta, do diagnóstico, a testagem do HIV precisa estar na rotina dos serviços de saúde e da população. “Nove por cento as pessoas estão vivendo normalmente e, sem saber, transmitindo o vírus.”

Já no caso dos 19% que sabem do diagnóstico, mas que não estão em tratamento, ela defende que os serviços de saúde façam seguimento desses pacientes e criem estratégias de retenção. “Tem que ligar, perguntar por que não foi buscar a medicação. Tem que ter uma aproximação maior com as pessoas vivendo com HIV/aids.”

Os dados também mostram que o Brasil, pelo segundo ano consecutivo, registra uma estabilidade da epidemia. “É um indício de que alguma coisa não está bem, um certo número de infecções estão acontecendo, e pessoas estão sendo deixadas para trás.”

Prevalência

De acordo com o relatório, a maior prevalência das infecções no Brasil está entre as pessoas trans (30%), homens que fazem sexo com homens (18%) e trabalhadores do sexo (5,3%).

“No Brasil, a população trans tem sido usada politicamente para causar pânico na sociedade. A gente vê projetos de lei propondo criminalização do cuidado, da aceitação dos pais. Esses projetos causam uma barreira de acesso ainda mais forte do que todas as outras barreiras estruturais.”

O relatório também traz um posicionamento contrário às leis que criminalizam pessoas de populações-chave, ou seus comportamentos. Em 145 países, é crime o uso ou posse de pequenas quantidades de drogas. Cento e sessenta e oito países criminalizam algum aspecto do trabalho sexual, 67, a relação sexual consensual entre pessoas do mesmo sexo, e 20, entre pessoas transgênero.

Segundo Ariadne, algumas pesquisas já demonstraram que o estigma e a discriminação estão presentes em quase todas as áreas da vida dessas populações mais afetadas pelo HIV. Um trabalho de 2019 apontou, por exemplo, que 6% da pessoas trans foram discriminadas dentro dos próprios serviços de saúde no Brasil.

O Unaids considera que Brasil, por sua vez, está no caminho, com suas metas na casa de 88-83-95. Mas o país ainda enfrenta obstáculos, causados especialmente pelas desigualdades, que impedem que pessoas e grupos em situação de vulnerabilidade tenham pleno acesso aos recursos de prevenção e tratamento do HIV que salvam vidas.

Ariadne disse que há estados, especialmente os da região Norte, que precisam não só de um trabalho mais profundo de estruturação dos serviços de saúde, mas também de trabalhar aspectos culturais que fazem com que as populações mais afetadas pelo HIV tenham dificuldades de acessar as políticas públicas de saúde, de educação, de trabalho.

“Sem essas garantias, fica muito mais difícil que essas pessoas consigam manter o tratamento com antirretrovirais, que é contínuo e exige uma alimentação regrada.”

Fonte: Agência AIDS.

De frango a macarrão instantâneo: por que furtos de R$ 4 chegam até no STF (UOL)


Casos de furto de chicletes, frango, macarrão instantâneo, papel higiênico e chocolate continuam chegando ao STJ e STF, mesmo após as Cortes já terem estabelecido que ocorrências desse tipo, que envolvem valores baixos, não deveriam ser punidas.

O que tem acontecido

Mãe de cinco filhos, desempregada e em situação de rua, Janaína (nome fictício) foi presa em 2021 após furtar dois pacotes de macarrão instantâneo, dois refrigerantes e um refresco em pó de um supermercado em São Paulo, avaliados em R$ 21,69. O Tribunal de Justiça negou a soltura dela sob o argumento da reincidência. Ela só deixou a prisão depois que o caso foi levado pela Defensoria ao STJ. Para o ministro Joel Ilan Paciornik, o valor dos produtos (menos de 2% do salário mínimo) e o estado de necessidade da mulher não justificaram o prosseguimento do caso.

Em casos com o de Janaína, a orientação dos tribunais superiores é que seja aplicado o princípio da insignificância. Também conhecido como princípio da bagatela, é um entendimento jurídico cujo objetivo é não penalizar furtos de baixo valor ou famélico — quando alguém furta comida, medicamentos ou qualquer outro item que seja imprescindível para sua sobrevivência ou de outra pessoa. Diferentemente do roubo, não deve haver uso de ameaça, violência ou arma.

Em 2004, o Supremo estabeleceu requisitos para a aplicação do princípio, como se houve ou não emprego de violência e a inexpressividade do dano. Esse entendimento não é obrigatório e serve para orientar os juízes a desconsiderar os casos em que o valor do furto não causa prejuízo à vítima —comida, chinelos, papel higiênico e sucata, por exemplo.

São produtos de primeira necessidade. Quem é que furta dois pacotes de fralda para enriquecer?
Questiona o defensor público federal Gustavo de Almeida Ribeiro.

Mas casos continuam chegando. Apesar do entendimento, dados do STF mostram que, desde 2013, houve 571 acórdãos (decisão de órgão colegiado de um tribunal) e 3.305 decisões monocráticas (proferida por um ministro) sobre insignificância, média de 26 por mês. No STJ, os registros mostram 7.702 acórdãos e 62.771 decisões monocráticas para o tema. Não é possível somar as ações protocoladas nas duas Cortes, pois um mesmo processo pode ser julgado nas duas por causa de recursos.

Defensores públicos ouvidos pelo UOL apontam que o princípio da insignificância nem sempre é seguido. Juízes e desembargadores não só mantêm as prisões como condenam as pessoas acusadas de furto famélico, mesmo num cenário de aumento da fome no país — uma pesquisa divulgada no ano passado apontou que o problema atingia 33 milhões de brasileiros.

Os defensores dizem que os juízes alegam diferentes motivos para não aplicar o princípio da insignificância — desde que ele não existe até a reincidência do réu. Com os recursos dos advogados, esses processos fazem crescer o acervo dos tribunais superiores, causam mais lentidão à Justiça e levam mais pessoas ao já inchado sistema carcerário.

Ribeiro, que atua no STF desde 2007, diz que os casos de furto por fome ou de pequenos valores que chegam até as mais altas instâncias do Judiciário são comuns. Há uma ala no STF que defende que a reincidência não muda o fato de que o valor do furto é insignificante —a presidente da Corte, Rosa Weber, e os ministros Edson Fachin e Gilmar Mendes foram citados como exemplos. O ministro André Mendonça negou recentemente a aplicação do princípio no caso de uma mãe condenada por furtar fraldas, em Montes Claros (MG), que era reincidente.

A DPU (Defensoria Pública da União) propôs ao STF uma súmula vinculante para evitar que os tribunais neguem, de forma genérica, a possibilidade da aplicação da insignificância. A súmula é um mecanismo para uniformizar decisões sobre determinados temas. “O objetivo dessa súmula é o reconhecimento por parte do STF, de forma vinculante, de que esse princípio existe e pode ser aplicado no direito brasileiro”, diz Ribeiro.

Prisão por chocolate, frango e chiclete

Ana (nome fictício) tinha 35 anos quando foi presa em flagrante pela tentativa de furto de 18 chocolates e 89 chicletes de um trailer em Boa Esperança (MG) no valor de R$ 50, em 2013. Condenada, ela viu seu caso parar no STF com a atuação da Defensoria Pública. Em 2021, o ministro Nunes Marques negou pedido de absolvição porque ela estava acompanhada de um rapaz na hora do furto. Ele só reconsiderou e decidiu pela absolvição dela no mês passado.

É terrível, principalmente quando é – e normalmente é – [casos de] mãe ou pai que tem filhos pequenos. Essa pessoa, no desespero, acaba cometendo esse tipo de furto e se cria um desastre familiar: a mãe presa e os filhos pequenos sem qualquer pessoa para cuidar. Muitas vezes o furto nem se efetiva, porque são casos de flagrante, o produto é devolvido e não há prejuízo. Óbvio que ninguém esta defendendo que se furte, mas se acontece as medidas têm que ser proporcionais ao que aconteceu, não sair prendendo, condenando todo mundo.
Rafael Muneratti, defensor público de SP com atuação em Brasília que defendeu Janaína

Antonio (nome fictício) foi flagrado em 2017 pelo segurança de um supermercado de Araxá (MG) furtando dois filés de frango, cada um no valor de R$ 2, alegando que estava com fome. Ele devolveu os alimentos, mas acabou preso. Apesar de o próprio delegado ter apontado a “condição de miséria” dele e o baixo valor dos produtos, Antônio foi denunciado e virou réu. O caso chegou ao STJ e, somente em junho de 2021, a ação foi trancada.

O processo envolvendo um furto de R$ 4 mobilizou a Justiça por quatro anos. No julgamento de Antônio, o ministro Sebastião Reis Júnior fez duras críticas aos agentes da Justiça que deixaram um processo como esse chegar à Corte.

Essa situação ocorre porque a advocacia e o Ministério Público insistem em teses superadas, mas também porque os tribunais se recusam a aplicar os entendimentos pacificados no STJ. No Legislativo, discute-se o aumento das penas, mas não se debate a ressocialização e a prevenção de crimes.
Sebastião Reis Júnior, ministro do STJ

O defensor público Flávio Aurélio Wandeck Filho, que atuou nessa ação, destaca que muitas vezes o custo processual é maior do que o prejuízo dos itens furtados. Um estudo da DPU (Defensoria Pública da União) divulgado no ano passado indica que cada ação custe ao Estado no mínimo R$ 6.400.

Um processo como esse tem um custo para o Estado. São vários servidores públicos envolvidos numa ação como essa: os policiais, o delegado, o promotor, juízes, desembargadores, ministros, defensores públicos. Enquanto o tribunal está se ocupando disso não está julgando outras coisas relevantes, como homicídio, estupro, tráfico, na celeridade que deveria ser. Os recursos públicos são finitos. Tem muita coisa que não deveria estar lá.
Flávio Aurélio Wandeck Filho, da Defensoria Pública de Minas Gerais

Os defensores também argumentam que prender pessoas que cometem crimes de baixo potencial ofensivo sobrecarrega o sistema carcerário — manter alguém atrás das grades no Brasil custa em torno de R$ 1.800 por mês, de acordo com um levantamento feito pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) — e manifestam a preocupação de que essas pessoas sejam cooptadas pelo crime organizado nos presídios.

Esse tipo de delito, de furto famélico, são pessoas de fato que não são criminosas propriamente ditas. São pessoas vulneráveis que, diante de situações complicadas da vida, tem que tomar essa atitude. Se entram no mundo penitenciário, aí sim muitas vezes acaba sendo cooptado por alguma facção, tendo contato com criminosos mais perigosos. A gente sempre defende que mesmo para os reincidentes não haja aplicação de pena de prisão.
Rafael Muneratti

Fonte: UOL.

EUA: Perseguição aos Homossexuais no Séc. XX

Reproduzo aqui o excelente trabalho de resgate da história feito pelo perfil “Pensar a História” no Twitter:

“Tão perigosos quanto os comunistas”: Artigo do jornal The New York Times publicado em 19 de abril de 1950 atesta a perseguição contra homossexuais empreendida pelo governo dos Estados Unidos durante o período do chamado “Terror Lilás”.

O termo “Terror Lilás” (“Lavender Scare”) refere-se à política oficial de criminalização e repressão aos homossexuais mantida pelo governo dos Estados Unidos desde a década de 1940, bem como ao “pânico moral” incitado contra homossexuais pelas autoridades e pela mídia.

O “Terror Lilás” surgiu como uma reação conservadora à tendência registrada nos “Loucos Anos 20” de maior aceitação às relações afetivas não normativas. Era, portanto, um instrumento de controle social que buscava atrelar a sexualidade às relações de produção capitalistas.

O fenômeno transcorreu de forma paralela à chamada “Ameaça Vermelha” — a histérica campanha anticomunista liderada pelo senador Joseph McCarthy, que resultou em intensa perseguição política e repressão aos indivíduos suspeitos de serem simpatizantes do comunismo.

Apoiado por congressistas eleitos com pautas moralistas e forte lobby de pastores neopentecostais, o governo dos EUA passou a naturalizar discursos de ódio contra gays e lésbicas, rotulando-os como “grandes ameaças à segurança nacional”.

Homossexuais passaram a ser preteridos em vagas do serviço público. Alegava-se que o medo da exposição os tornaria mais suscetíveis à chantagem de agentes externos, facilitando sua cooptação como espiões e colocando o governo estadunidense em risco.

A associação entre homossexualidade e comunismo também era baseada em estigmas sobre a “revolução sexual” na URSS. Em 1917, um mês após a revolução socialista, a Rússia se tornou um dos primeiros países a descriminalizar a homossexualidade (medida revertida nos anos 30).

A URSS promoveu os estudos pioneiros de Grigorii Batkis, afirmando que a homossexualidade era uma expressão natural da sexualidade humana. A homossexualidade assumida de Georgy Chicherin, Ministro das Relações Exteriores da URSS, também escandalizava os estadunidenses.

A perseguição do governo estadunidense contra a população LGBT intensificou-se nos anos 50, quando a legislação federal passou a descrever homossexuais como “subversivos”, “pervertidos sexuais” e uma “ameaça ao estilo de vida americano”.

As relações homossexuais foram criminalizadas em todos os estados do país, sob a tipificação de “sodomia”, punível com prisão. Na Carolina da Norte, réus primários acusados de Sodomia poderiam ser condenados a até 60 anos de reclusão.



Difusão de boatos e teorias da conspiração para alarmar a população e colocar a opinião pública contra os homossexuais eram frequentes. A imprensa publicava dicas de “como reconhecer” homossexuais” e exortava o público a denunciá-los às autoridades.

Médicos e cientistas que desmentissem a correlação entre homossexualidade, perversão e desequilíbrio psicológico tornavam-se alvos do governo. Iniciou-se uma verdadeira “caça às bruxas” junto à população, paralelamente ao expurgo dos homossexuais no serviço público.

Em 1953, Dwight Eisenhower emitiu a ordem executiva 10.450, autorizando a repressão contra homossexuais no serviço público, incluindo demissão sumária e prisão. Mais de 200 mil servidores, sobretudo militares, foram presos após serem acusados de serem homossexuais.

A perseguição não se limitava ao serviço público. Qualquer cidadão “suspeito” de ser homossexual podia ser fichado em “listas de pervertidos”, internado ou preso. Linchamentos e suicídios eram comuns. Muitos acabavam tirando a própria vida após serem fichados.

Entre as décadas de 50 e 70, vários estados dos EUA aprovaram o uso de castração química para punir homossexuais. Leis autorizando terapias de conversão, incluindo-se lobotomia e choques elétricos, também foram promulgadas.

A reação à perseguição violenta contra homossexuais acabou por estimular o nascimento dos movimentos de defesa dos direitos da população LGBT na segunda metade da década de 50.

Politicamente organizado, o movimento LGBT passou a fazer oposição à campanha de perseguição do governo, conseguindo obter avanços legais de grande importância dos anos 60 em diante. Em Nova York, a Rebelião de Stonewall se tornaria um marco da resistência LGBT.

Apesar dos avanços, o Terror Lilás deixou profundas marcas na sociedade estadunidense. A ordem executiva 10.450, que autorizava a perseguição governamental contra homossexuais, somente foi revogada em 1995.

O ingresso de LGBTs no serviço público continuaria limitado e a política de investigação da vida sexual de funcionários públicos também seguiu como norma em algumas localidades dos EUA até o fim dos anos 90.

Em diversos estados, a homossexualidade era proibida por lei até 2003, quando um julgamento da Suprema Corte definiu jurisprudência sobre o assunto. Apesar disso, sete estados seguem possuindo leis homofóbicas em vigor até os dias de hoje.

(Download Gratuito) Livro: “Direitos Fundamentais Estaduais e Constitucionalismo Subnacional”

Foi disponibilizado, gratuitamente, o livro “Direitos Fundamentais Estaduais e Constitucionalismo Subnacional“.

O livro DIREITOS FUNDAMENTAIS ESTADUAIS E CONSTITUCIONALISMO SUBNACIONAL traz, de forma pioneira, o tema dos direitos fundamentais estaduais no país. Normalmente o tema dos direitos fundamentais é examinado em uma perspectiva federal. Porém, o espaço constitucional subnacional não pode ser desconsiderado enquanto um ambiente propício à criação de (novos) direitos .

Se os direitos fundamentais estão no eixo do constitucionalismo e se os Estados podem criar constituições estaduais, naturalmente eles podem também criar cartas de direitos estaduais (state bill of rights).

O livro explora a temática do federalismo, constitucionalismo subnacional e direitos fundamentais por meio de trabalhos de diversos autores, trazendo reflexões importantes sobre o tema principal da obra: direitos, liberdades e garantias fundamentais subnacionais, e sobre temas conexos da maior magnitude e atualidade, tais como o federalismo e o enfrentamento da pandemia de COVID-19 pelos entes federativos .

O presente livro é fruto de uma interlocução que já dura alguns anos entre o Constate – Centro de Estudos Constitucionais em Federalismo e Direito Estadual (ConState) e o SubConst – Núcleo de Pesquisa em Subconstitucionalismo da UFMS/CPTL

Clique AQUI para baixar seu livro e tenha uma boa leitura. 

Ouça áudios que ajudaram a condenar Robinho por estupro coletivo na Itália: “Não estou nem aí”

Vamos lembrar do caso do Robinho e outros similares:

ex-jogador Robinho foi condenado em todas as instâncias da Justiça da Itália por estupro coletivo. O caso, datado de 2013, foi investigado pela polícia italiana. Nesta quarta-feira (18), foram divulgadas conversas interceptadas que mostram a reação do jogador ao ficar sabendo das denúncias sobre participação no estupro coletivo.

A CNN teve acesso aos áudios.

“Por isso que eu estou rindo, eu não estou nem aí. A mina, a mina estava extremamente embriagada, não sabe nem quem que eu sou”, diz o ex-jogador do Milan.

Em outro diálogo, Robinho chega a fazer ameaças de agressão. “A mina sabe que tu não fez porra nenhuma com ela, ela é idiota? A gente vai dar um soco na cara dela”, completou.

Robinho faz pouco caso das acusações

Os diálogos foram divulgados pelo UOL Esporte no podcast “UOL Esporte Histórias”. O material mostra como o ex-jogador, num primeiro momento, tratou com descaso a formalização da denúncia do que aconteceu em 2013.

Ao longo dos diálogos divulgados, Robinho se contradiz. Nas primeiras conversas interceptadas, o ex-jogador faz pouco caso das acusações e afirma não ter tocado na garota. A investigação da polícia italiana, por meio de provas forenses e baseado também em próprias falas do brasileiro, provou o contrário.

“Eu vi o Rudney rangando ela, e os outros caras rangando ela. Então os caras que rangaram ela vão se f*der”, diz Robinho em outro momento. Rudney é um dos amigos do atleta que estava em Milão.

Foram ao menos seis pessoas que tiveram algum tipo de contato com a mulher que formalizou a denúncia em 2014. O grupo foi denunciado no artigo 609 do Código Penal Italiano, que descreve o crime de violência sexual de grupo.

Diálogos mostram como Robinho e Ricardo Falco, condenados em todas as instâncias da Justiça italiana, combinaram com seus amigos versões diferentes para compartilhar ao longo do depoimento.

A defesa de Robinho foi procurada pela CNN e não respondeu até a publicação desta reportagem.

O caso

Em 2017, Robinho foi condenado a 9 anos de prisão por participação em estupro coletivo. O brasileiro recorreu da sentença e, em janeiro de 2022, foi condenado em última instância, não cabendo mais recursos.

A Justiça italiana pediu que Robinho cumpra a pena no Brasil, uma vez que o país não extradita cidadãos brasileiros. Em fevereiro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) concordou em transferir a pena.

Cabe agora, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), analisar a sentença italiana. O STJ vai analisar se a decisão atende os requisitos para ser cumprida no Brasil.

Fonte: CNN.

Uganda Aprova PENA DE MORTE para LGBT

Uganda promulga lei anti-LGBTQ que inclui pena de morte

Relações entre pessoas do mesmo sexo são ilegais no país africanoPresidente de Uganda, Yoweri Museveni, durante entrevista à Reuters em sua fazenda em Kisozi

O presidente de Uganda, Yoweri Museveni, sancionou uma das leis anti-LGBTQ mais duras do mundo, incluindo a pena de morte para “homossexualidade agravada”, atraindo críticas ocidentais e arriscando sanções de doadores de ajuda.

As relações entre pessoas do mesmo sexo já eram ilegais em Uganda, assim como em mais de 30 países africanos, mas a nova lei vai além.

Estipula a pena de morte para “infratores em série” contra a lei e transmissão de uma doença terminal como HIV/Aids através do sexo gay. Também determina uma sentença de 20 anos por “promover” a homossexualidade.

“O presidente de Uganda legalizou hoje a homofobia e a transfobia patrocinadas pelo Estado”, disse Clare Byarugaba, ativista de direitos humanos de Uganda. “É um dia muito sombrio e triste para a comunidade LGBTQ, nossos aliados e toda Uganda.”

Ela e outros ativistas prometeram contestar judicialmente a lei, a qual Museveni foi mostrado assinando em sua mesa com uma caneta dourada em uma foto postada no Twitter pela Presidência do país. O líder de 78 anos chamou a homossexualidade de “desvio do normal” e pediu aos parlamentares que resistam à pressão “imperialista”.

Museveni enviou o projeto de lei original aprovado em março de volta aos parlamentares, pedindo-lhes que reduzissem o tom de algumas disposições. Mas sua aprovação final não foi vista com desconfiança em um país conservador onde as atitudes anti-LGBTQ tornaram-se mais duras nos últimos anos, em parte devido à campanha de grupos religiosos evangélicos ocidentais.

Uganda recebe bilhões de dólares em ajuda externa todos os anos e agora pode enfrentar sanções.

Em uma declaração conjunta nesta segunda-feira, o PEPFAR, Fundo Global de Combate à Aids, Tuberculose e Malária, e o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) disseram que a lei coloca a luta anti-HIV de Uganda “em grave risco”.

Fonte: CNN Brasil.

STF adia julgamento sobre descriminalização do porte de dr8gas

Para entender o caso:

O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou mais uma vez o julgamento que trata da possível descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal. O recurso sobre o assunto foi agendado para esta semana, mas foi retirado da pauta do plenário. 

O processo sobre o tema estava na pauta de julgamentos de quarta-feira (24), mas não foi chamado, já que os ministros utilizaram toda a sessão para analisar uma ação penal contra o ex-presidente Fernando Collor. Havia expectativa de que a descriminalização pudesse ser chamada nesta quinta-feira, mas ainda pela manhã o recurso foi retirado de pauta.

Questionada, a assessoria do Supremo disse apenas que a presidente da Corte, ministra Rosa Weber, a quem cabe administrar a pauta, analisa nova data para remarcar o julgamento do caso, que foi iniciado há oito anos, quando foi interrompido por um pedido de vista, e desde então não voltou a ser discutido em plenário. 

Votos

Até o momento, três ministros – Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Gilmar Mendes – votaram, todos a favor de algum tipo de descriminalização da posse de drogas. O recurso sobre o assunto possui repercussão geral reconhecida, devendo servir de parâmetro para todo o Judiciário brasileiro. 

Mendes foi o único a votar pela descriminalização do porte de qualquer droga, sem especificar quantidade, em razão do direito à intimidade e à inviolabilidade da vida pessoal do usuário. Fachin, por sua vez, sugeriu que seja descriminalizado apenas o porte de maconha. Barroso também votou nesse sentido, e sugeriu que o Supremo determine que não é crime andar com até 25 gramas de maconha ou cultivar até seis plantas para consumo pessoal. 

A análise do caso foi interrompida, ainda em 2015, por uma vista (mais tempo de análise) pedida pelo ministro Teori Zavascki, que morreu em 2017. Ele foi substituído por Alexandre de Moraes, que liberou o recurso para ser pautado ainda em 2018. Desde então, o caso ficou parado na Corte, atravessando diversas presidências do Supremo. 

O caso trata da posse e do porte de drogas para consumo pessoal, infração penal de baixa gravidade que consta no artigo 28 da Lei das Drogas (Lei 11.343/2006). As penas previstas são brandas: advertência sobre os efeitos das drogas, serviços comunitários e medida educativa de comparecimento a programa ou curso sobre uso de drogas. 

Argumentos

Apesar disso, os críticos alegam que o dispositivo dá excessivo poder discricionário aos juízes para enquadrar quem for flagrado com drogas como usuário ou traficante, uma vez que a lei não prevê quantidade específica para definir o uso pessoal. 

Entidades de defesa dos direitos das pessoas negras, por exemplo, argumentam que isso leva à discriminação e escancara o racismo nas decisões judiciais, uma vez que a grande maioria dos presos por tráfico são negros, ainda que boa parte tenha sido flagrada com quantidades menores de droga do que réus brancos enquadrados como usuários. 

Mesmo quem é enquadrado como usuário precisa enfrentar processo penal e perde benefícios como o de ser réu primário, o que favorece quem tem mais condições para pagar por melhores advogados, argumentam os defensores da descriminalização. 

Quem é contra a descriminalização argumenta que, ao consumir drogas ilegais, o usuário ameaça a saúde pública e alimenta o tráfico, motivo pelo qual não se poderia falar em inconstitucionalidade da lei. Outro argumento é o de que o uso pessoal já foi despenalizado, não havendo sanções mais graves, o que esvaziaria a necessidade de se descriminalizar o uso. 

Outro ponto discutido pelos ministros é se cabe ao Supremo atuar sobre o tema ou se é responsabilidade apenas do Legislativo deliberar sobre a criminalização ou não do porte de drogas e do consumo pessoal. 

Caso concreto

No caso concreto, o Supremo analisa um recurso contra uma decisão da Justiça do Estado de São Paulo, que manteve a condenação de um homem pelo porte de três gramas de maconha para uso pessoal. 

Para o defensor público Leandro de Castro Gomes, que atua no caso, a quantidade ínfima de droga não representa risco à saúde pública, mas apenas à saúde pessoal do usuário. Por esse motivo, não haveria dano capaz de configurar crime, argumenta o defensor. 

Para o estado de São Paulo e o Ministério Público paulista, a lei que tipifica o crime de porte de drogas para consumo pessoal não possui nenhuma irregularidade e o dano à saúde pública causado pelo usuário é de natureza abstrata, motivo pelo qual não poderia ser quantificado. Outro argumento é que o uso de drogas alimenta o tráfico, que o Estado tem o deve de combater. 

“A Constituição Federal dispõe que o Estado tem o dever de reprimir o tráfico e a lei assegura ao usuário ou dependente tratamento juridicamente diferenciado do traficante”, argumentou Marcio Elias Rosa na tribuna do Supremo, então procurador-geral de São Paulo quando foi iniciado o julgamento, em 2015.  

Fonte: Agência Brasil.

Marco Feliciano tem R$ 254 mil penhorados pela Justiça após ser condenado por LGBTfobia

Vale lembrar que LGBTfobia é CRIME de RACISMO:

A Justiça de São Paulo confirmou penhora de R$ 254.240,75 de uma conta do deputado federal Marco Feliciano (PL-SP) após ele ser condenado em processo movido por ONG por incentivar discriminação contra LGBTs.

Segundo a coluna de Ancelmo Gois, no jornal O Globo, o valor será destinado à ONG Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual (Abcd’s).

A condenação se refere a uma ação movida pela Abcd’s que corre na Justiça desde 2015. A decisão pela penhora ocorreu no último dia 5 de maio.

O caso teve início quando uma atriz desfilou crucificada na Parada Gay de São Paulo, em ato de protesto contra o alto número de mortes entre pessoas LGBTQIA+.

Na época, Feliciano classificou o protesto como “blasfêmia” e disse que a organização do evento teria cometido “crime de profanação contra símbolo religioso”. Ele chegou a defender a proibição da Parada Gay.

Inicialmente, ele foi condenado a pagar R$ 100 mil por danos morais coletivos, e o valor vem sendo corrigido desde então, até alcançar o montante atual.

Fonte: DCM.

Coletivo de mulheres faz novas denúncias de assédio sexual de Boaventura

Três pesquisadoras, duas delas brasileiras, relatam assédio sexual, moral e intelectual


Mais mulheres se juntam às acusações de assédio contra Boaventura de Sousa Santos, diretor do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra. Depois da denúncia de assédio sexual feita pela deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL-MG), publicada em primeira mão pela Agência Pública, no dia 14 de abril, um Coletivo de Mulheres formado por pesquisadoras que trabalharam com o professor entregou uma carta à Universidade de Coimbra acusando Boaventura de assédio sexual, assédio moral e extrativismo intelectual (quando há apropriação do trabalho intelectual sem o devido reconhecimento de autoria e remuneração). 

Os relatos são de duas brasileiras e uma portuguesa, que estiveram em equipes chefiadas por Boaventura entre 2000 e 2019. Das três pesquisadoras, duas ainda mantêm vínculo com o Centro. A carta foi entregue no último dia 17, com o título “NÃO É DIFAMAÇÃO, NEM É VINGANÇA. SEMPRE FOI ASSÉDIO”. 

À Pública, o coletivo relatou duas situações de assédio sexual. De acordo com elas, em uma conversa privada, Boaventura disse a uma pesquisadora que eles poderiam “ter uma relação especial” e que, “quando olha para as pernas dela, tem desejo”. Em outro caso, elas dizem que o professor mencionou o corpo e as pernas da pesquisadora, numa comunicação por e-mail. “A pesquisadora assediada por e-mail recebeu um “forte assédio moral tendo seu trabalho desqualificado” por não ceder às investidas, informou o coletivo. 

Em entrevista à Pública, a advogada feminista e popular Daniela Félix, representante legal do coletivo de vítimas do professor Boaventura, disse que “um dossiê com provas será apresentado à Universidade de Coimbra, tão logo se estabeleça uma comissão independente de investigação”. “Temos cinco testemunhas dispostas a prestar depoimento, além das vítimas. Também temos mensagens, e-mails e documentos”, adiantou. 

O coletivo criou um canal para colher relatos de outras vítimas de Boaventura no e-mail querocontarminhahistoriaem23@gmail.com.  

“A ideia é oferecer auxílio e acolhimento para essas pessoas”, disse a advogada. Na semana passada, a Universidade de Coimbra confirmou, por nota, que vai criar uma comissão independente para averiguação das ocorrências contra o professor. Até a publicação desta reportagem, contudo, a instituição não confirmou o recebimento da carta das pesquisadoras, nem deu respostas ao coletivo. 

Na semana passada, a Direção e Presidência do Conselho Científico do Centro de Estudos Sociais informou à reportagem, em resposta aos questionamentos feitos a partir das denúncias da deputada Bella Gonçalves, que, tanto Boaventura quanto seu auxiliar, também acusado de assédio, foram “suspensos dos cargos que ocupavam”.

Por nota à reportagem, o professor disse que decidiu se “autoafastar das atividades do CES” para que a instituição possa fazer averiguações das informações “sem que haja qualquer interferência”. Sociólogo português, Boaventura de Sousa Santos é considerado um dos principais intelectuais da língua portuguesa, com livros e estudos em áreas como sociologia do Direito, sociologia política, direitos humanos, movimentos sociais, entre outros temas. 

Os relatos das pesquisadoras do coletivo ampliam a sequência de acusações de assédio sexual contra ele, que despontaram a partir de uma publicação sobre má conduta sexual no meio acadêmico, em março. Boaventura classificou as denúncias publicadas em março como “vingança” e prometeu apresentar queixa-crime contra as autoras. As integrantes do coletivo afirmam que as práticas abusivas do professor “eram de amplo conhecimento” da Universidade de Coimbra. Em 2018, pichações anônimas nos muros da instituição já chamavam atenção para os casos. Os grafites diziam: “Fora Boaventura. Todas sabemos”.  



“O abuso não é sempre fácil de identificar. Nos momentos em que partilhamos com outras pessoas as violências vividas, encontramos uma reiterada normalização das más práticas ou a ideia da sua inevitabilidade em relações de hierarquia entre homens e mulheres. No caso em questão, entre um homem no mais alto patamar da carreira acadêmica e mulheres em diferentes níveis de precariedade e vulnerabilidade”, diz um trecho da carta do coletivo. 

As pesquisadoras relatam que as práticas abusivas do professor, e de pessoas com autoridade legitimada por ele, atingiam homens e mulheres. “Mas as mulheres eram desproporcionalmente impactadas com a sobrecarga de trabalho, excesso de demandas, e com a frequência com que seu trabalho era depreciado. Pedidos domésticos eram dirigidos às pesquisadoras, como pedir que lhe seja servido um café ou que assegurem que ele tem bananas e água enquanto estava hospedado em viagens para alguma atividade”, narram em outro trecho da carta.

Além do trauma, as pesquisadoras relatam que os assédios e abusos tiveram sérios impactos no desenvolvimento das carreiras. “Estamos, há anos, gerindo por conta própria os danos emocionais e materiais dessa relação laboral”. O coletivo pede que a Universidade de Coimbra crie “mecanismos de recebimento de outras denúncias e materiais probatórios” contra Boaventura e “que seja dada garantia absoluta de sigilo às mulheres que queiram denunciar ou juntar provas a esse processo”. 

Fonte: A Pública.

TRF-1 inocentou 99,52% dos acusados de submeter pessoas a condições análogas à escravidão

Trabalho Escravo vale a pena no Brasil:

‘EXAGERO’ E ‘REALIDADE RÚSTICA’: LEIA O QUE ESCREVEM DESEMBARGADORES E JUÍZES AO INOCENTAR PATRÕES ACUSADOS DE TRABALHO ESCRAVO

HÁ QUASE 18 ANOS, uma operação de auditores fiscais do trabalho resgatou 43 pessoas da fazenda de Marcos Nogueira Dias, o Marcão do Boi, na zona rural de Abel Figueiredo, no Pará. O fazendeiro era conhecido como um dos mais ricos do sudeste do estado. Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, o MPF, os trabalhadores bebiam água fétida, comiam carne podre de vacas que morriam no parto, não tinham salário e recebiam bebida alcoólica como pagamento. Eles também tinham que comprar produtos de higiene superfaturados do patrão e eram submetidos a jornadas exaustivas “em sol escaldante”, inclusive nos feriados e fins de semana. 

Era evidente a condição de trabalho degradante e análoga à escravidão, de acordo com o MPF. Mas, para o desembargador Olindo Menezes, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o TRF-1, essas circunstâncias não eram degradantes, mas apenas comuns ao trabalho rural, que tem “o desconforto típico da sua execução, quase sempre braçal”, e não se caracterizavam como algo que “rebaixa o trabalhador na sua condição humana”. 

Seus argumentos convenceram os outros desembargadores da 4ª turma do TRF-1 a absolver Marcão do Boi em 2019. Ele chegou a ser condenado a cinco anos de prisão pela Vara Federal de Marabá. O juiz Fábio Ramiro, relator convocado que analisou o recurso na segunda instância, propôs aumento da pena para seis anos, mas o voto do desembargador Menezes mudou o rumo do processo. 

Ele alegou que o caso deveria ser melhor analisado, pois muitas denúncias de condições análogas à escravidão tinham como base apenas os levantamentos feitos pelos fiscais do Ministério Público do Trabalho, que “são muito ardorosos e, normalmente, feitos por pessoas que não têm a menor noção do que é um trabalho no meio rural. Os exageros, em muitos casos, são evidentes”, justificou, pedindo mais tempo para decidir seu voto.

Quando se manifestou, alguns meses depois, o desembargador Menezes votou pela absolvição de Marcão do Boi. Para o magistrado, as denúncias mencionadas na sentença, como os alojamentos insalubres, a falta de água potável, a comida podre “devem ser vistos dentro da realidade rural brasileira”, em que os patrões “não raro” também se submeteriam a tais condições, na visão de Menezes. O fazendeiro, contudo, já havia informado que só ia ao local onde os trabalhadores estavam “a cada trinta ou sessenta dias”. Era a sua defesa para alegar não ter conhecimento das condições precárias. 

Muitos operadores do direito, argumentou ainda o desembargador, “se contentam com os desconfortos mais comuns do trabalho rural para dar por configurado o trabalho análogo ao de escravo” quando seriam na verdade situações “comuns na realidade rústica brasileira” sem “gravidade intensa que implique a submissão dos trabalhadores a constrangimentos econômicos e morais inaceitáveis”. Marcão do Boi morreu em 2021, executado por pistoleiros, sem nunca ter sido preso pelo caso. 

Argumentos assim são recorrentes nas manifestações do desembargador. Encontrei ao menos outros quatro processos em que o magistrado votou pela absolvição do acusado, relativizando a denúncia por conta do lugar ou do tipo de trabalho realizado. As condições no meio rural, como em carvoarias ou em fazendas de café, segundo ele, são “duras pela própria natureza da atividade” e, por isso, não devem ser confundidas com trabalho análogo à escravidão. 

“A condenação somente se justifica em casos graves e extremos, sem razoabilidade, quando a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, alçando-se a níveis gritantes”. 

Não era o caso de trabalhadores de uma carvoaria submetidos pelo acusado a exaustivas 12 horas diárias de trabalho. Na interpretação de Menezes, tratava-se apenas de uma jornada “um pouco acima daquela prevista em lei, e realizada como forma de aumentar a produtividade”, como afirmou em um processo de 2013. 

Em processo de 2011, como os trabalhadores ficaram poucos dias submetidos à situação degradante justamente pela ação de resgate do Ministério Público do Trabalho, o desembargador minimizou a denúncia. No entendimento dele, como os trabalhadores ficaram menos de 30 dias nas condições descritas na denúncia, não havia justificativa para “imputação de trabalho escravo”. 

Menezes ainda considerou favorável aos trabalhadores quando o empregador deixou de pagar R$ 40 por cada alqueire roçado – uma medida que equivale a cerca de 3,4 mil campos de futebol – para pagar R$ 25 a diária. Segundo o magistrado, o acusado teria constatado que levaria vários dias para executar o trabalho e entrou em acordo com relação ao novo valor. “O que parece ter constituído um benefício para os trabalhadores e não um malefício, como quer fazer parecer a acusação”.

Considerando apenas o salário bruto, o magistrado ganha quase R$ 1,2 mil por dia, inclusive quando não trabalha, como em feriados e fins de semana. Seu salário mensal fixo é de R$ 35,4 mil, mas devido a algumas gratificações e benefícios como auxílio alimentação, nesse mês de março, ele recebeu, já com os descontos, R$ 37,4 mil. 

Procuramos o desembargador Menezes por meio da assessoria de imprensa do TRF-1 e informamos os números de todos os processos analisados, bem como os trechos que destacamos nesta reportagem, para que ele pudesse se manifestar. O magistrado, contudo, não respondeu a nenhum dos seis questionamentos.

Vale ressaltar que, juridicamente, não existe a figura do trabalho escravo, mas sim a do trabalho em condições análogas à escravidão, já que, a nível oficial, a escravidão acabou com a Lei Áurea, em 1888. No entanto, o Intercept tomou a decisão de usar a expressão, entendendo que a imposição de um regime de trabalho degradante, com jornadas exaustivas e sem o devido pagamento salarial não pode ser chamada de outra forma, senão de trabalho escravo.

Para o desembargador Olindo Menezes, trabalhadores que recebiam água fétida, carne podre e não tinham salário não estavam em situação degradante. Foto: José Alberto/STJ

A culpa é da vítima 

Segundo Lívia Miraglia, coordenadora da Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, a falta de sensibilidade com processos como esses se explica porque o Judiciário é majoritariamente elitista, branco e masculino. 

“As pessoas que trabalham nesse poder estão muito distantes da realidade dos brasileiros que são submetidos à condição de trabalho análoga à escravidão. Há um espelhamento maior do Judiciário com os empregadores julgados do que com os trabalhadores”. 

A clínica coordenada por Miraglia, junto com o Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública, também da UFMG, traçou um raio-x das ações judiciais de trabalho escravo. O levantamento de quase 1.900 ações iniciadas entre 2008 e 2019 constatou que o TRF-1 é o tribunal federal que mais absolve os acusados de trabalho análogo à escravidão na segunda instância – apenas 0,48% deles foram condenados. Dos 293 empregadores condenados por juízes da primeira instância, o tribunal absolveu 254, o equivalente a 86,7%. 

Abrangendo os estados da Amazônia Legal, um área de intenso conflito agrário, o TRF-1 tem o maior número de acusados por trabalho análogo à escravidão – 1.943, quase sete vezes mais que a quantidade de acusados no TRF-3, que aparece em segundo lugar. Já o Pará, estado de Marcão do Boi, tem o maior número de empregadores incluídos na lista suja do trabalho escravo – 152 pessoas.

A impunidade, segundo Miraglia, leva os empregadores a concluírem que compensa submeter pessoas à situação degradante. “A falta de punição impede a perspectiva de mudar esse cenário no presente e no futuro, porque o crime continuará sendo praticado”. 

O próprio fazendeiro Marcos Nogueira Dias entrou na lista duas vezes quando estava vivo. Três anos depois dos 43 trabalhadores serem resgatados em Abel Figueiredo, 11 pessoas foram libertadas em outra fazenda dele, dessa vez localizada em Rondon do Pará. 

Mapeei ao menos 17 processos em que magistrados do TRF-1 absolveram acusados de submeter pessoas a trabalho escravo em suas decisões. Oito deles têm manifestação do desembargador Menezes, mas também aparecem na lista outros nomes, como o do juiz Leão Aparecido Alves, que atuou como relator convocado em alguns processos em segunda instância – para ele, a solução do problema, nesses casos, parece caber às vítimas.

Para Fachin, é inconstitucional usar a região como critério para caracterizar um trabalho como degradante.

Em uma ação de 2009, ele votou pela absolvição do réu porque, entre outros argumentos, não foi apresentado teste para comprovar que a água era imprópria para consumo. Além disso, escreveu que “os trabalhadores não estavam impedidos de ferver a água a ser por eles consumida”. 

Em outro processo, de 2011, ele concordou com a decisão do juiz de primeira instância que absolveu o réu. Para os magistrados, o trabalho degradante e a jornada exaustiva só indicam que o trabalhador foi submetido à condição análoga à escravidão se ele for vítima de violência ou efetivamente privado de liberdade por meio de agressões ou ameaças. De outra forma, é livre para “abandonar o local e buscar melhores condições de trabalho”.

Procurado por meio da assessoria da justiça federal de Goiás, o juiz Alves respondeu que seu voto foi acompanhado nos dois processos, por unanimidade, pelos demais integrantes da Terceira Turma do TRF-1, resultando em decisões unânimes. Com relação ao processo de 2009, ele argumentou, entre outras coisas, que os trabalhadores “nunca foram constrangidos ou ameaçados e não se consideravam escravos” e que “os tribunais têm decidido que o simples descumprimento de normas de proteção ao trabalho não é conducente a se concluir pela configuração do trabalho escravo”.

Sobre o processo de 2011, ele disse que as testemunhas não relataram “o uso de violência contra os trabalhadores pelo empregador ou prepostos ou a presença de segurança armada na fazenda, tampouco noticiaram a existência de servidão por dívida ou o impedimento de deslocamento dos trabalhadores”. O magistrado acrescentou ainda que “condena quando há prova acima de dúvida razoável, e, em sentido oposto, absolve quando inexistem provas aptas a expurgar a dúvida razoável”.

Existe, de fato, um entendimento consolidado no meio jurídico de que o trabalho escravo se caracteriza pela privação de liberdade por meio de violência para forçar a permanência da vítima contra a sua vontade. A falta de provas de que as pessoas se sentiam como escravas, aliás, é um dos argumentos que se repetem para absolver os réus em todos os tribunais, de acordo com levantamento de que Miraglia participou. Nas 26 decisões analisadas, os magistrados alegaram que o consentimento da vítima afastaria o delito praticado.

Para a pesquisadora, esse entendimento só comprova quão distantes desembargadores e juízes estão da realidade de um trabalhador, por estranharem que ele não abandone o local de trabalho quando se percebe explorado ou, ainda, que não tenha ciência do crime a que é submetido.

“Parece uma situação fácil de ser resolvida. Se não está bom, basta ir embora. É o que essas pessoas fazem nas situações que lhes incomodam. Mas, para muitos brasileiros que precisam de qualquer coisa para sobreviver, não é bem assim”.

No seu voto a favor da condenação de Marcão do Boi, o juiz e relator convocado Fábio Ramiro citou a sentença do juiz de primeira instância para caracterizar o trabalho degradante como “aquele que priva o trabalhador de dignidade, que o desconsidera como sujeito de direitos, que o rebaixa e prejudica, e, em face de condições adversas, deteriora sua saúde”. Segundo o magistrado, a coação moral pode ser mais efetiva que a força física para manter a vítima em condição análoga à escravidão, principalmente quando o empregador lhe impõe dívidas, impedindo seu desligamento do serviço.

112 condenações em mais de 10 anos

De acordo com o raio-x das ações judiciais, as equipes de fiscalização resgataram mais de 20 mil trabalhadores de 2008 a 2019 e mais de 2,6 mil empregadores foram acusados por trabalho análogo à escravidão, mas apenas 112 foram condenados definitivamente – os magistrados absolveram, em primeira instância, quase metade dos acusados por falta de provas. A maior pena de prisão, após o processo transitado em julgado, foi de 11 anos e seis meses.

Mesmo assim, há quem afirme em suas decisões que há exagero nas leis trabalhistas. É o caso da desembargadora Cláudia Cristina Cristofani, do TRF-4. Assim como o desembargador Menezes, ela enfraquece as denúncias usando o mesmo argumento de serem características do meio rural. Em um processo de 2013, do qual foi relatora, a magistrada afirmou que as condições de alimentação e alojamento dos trabalhadores eram precárias, “quando considerados os padrões, elevados e irrealistas, requeridos pelas normas trabalhistas” e que “o empregador rural se vê obrigado a reduzir custos, a fim de manter um lucro cada vez menor”. Por isso, disse no seu voto pela absolvição do acusado, não era “razoável dar relevância criminal ao fornecimento de condições de trabalho idênticas às condições de habitat da localidade em que a atividade estava sendo prestada”. 

Procurada por meio da assessoria de imprensa do TRF-4, a desembargadora não se manifestou.

Em 2021, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux reconheceu a repercussão geral de um pedido de recurso extraordinário do MPF para debater o acórdão do TRF-1 que absolveu Marcão do Boi. Os procuradores querem o reconhecimento das condições retratadas nos autos como degradantes e afirmam que a absolvição “pode estimular o empregador rural, proprietário de fazenda no interior, a cada vez mais tratar os seus empregados de forma desumana”. O relator do processo no STF é o ministro Edson Fachin, que defende ser “inconstitucional a diferenciação regional dos critérios para caracterização do trabalho como degradante”. 

Se a água era imprópria para consumo, ‘os trabalhadores não estavam impedidos de ferver’.

O procurador-geral da República Augusto Aras concorda com a tese de Fachin. “A efetivação dos princípios da dignidade humana, da erradicação da pobreza e da redução das diferenças econômicas e sociais direciona-se no sentido de proteger o padrão de vida e as condições de trabalho minimamente satisfatórias nas diversas regiões brasileiras, de modo a equalizar a situação do trabalhador em todas as localidades do país”, disse o PGR, em fevereiro de 2022, em sua manifestação no processo.

O procurador também recomendou o restabelecimento da sentença de prisão de Marcão do Boi pelo crime previsto no artigo 149 do Código Penal, ou seja, por submeter pessoas a trabalhos forçados ou a jornadas exaustivas, sujeitá-las a condições degradantes e à restrição de locomoção. Mas quando tudo isso aconteceu, já era tarde demais para o fazendeiro ser punido pelo rigor da lei.

Fonte: The Intercept.

Ver também:

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO TERÁ DE INDENIZAR CONTARATO E MARIDO POR HOMOFOBIA COMETIDA POR PROMOTOR

Só para lembrar que LGBT+fobia é crime desde 2019:

 O líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES), e o seu companheiro, Rodrigo Groberio, serão indenizados pelo estado do Espírito Santo em razão de comentários de caráter homofóbico feitos por um promotor durante o processo de adoção de um dos filhos do casal, em 2017. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo condenou o estado a pagar R$ 12,7 mil a Contarato e outros R$ 12,7 mil a Rodrigo por causa da conduta do promotor Clóvis Barbosa Figueira.

A decisão transitou em julgado e, por isso, não cabe mais recurso. Eleito em 2018, o capixaba é o primeiro senador – e único até agora – a assumir sua homossexualidadeProcurado pelo Congresso em Foco, o Ministério Público do Espírito informou que nao se manifestará sobre o assunto, assim como o promotor Clóvis Barbosa.

“Agora, após o trânsito em julgado, ocorre a fase de cumprimento de sentença. O Estado do Espírito Santo foi condenado por danos morais pelo ato do promotor, e o Judiciário determinou que o Estado do Espírito Santo pague, de fato a indenização. É muito raro isso acontecer! Estamos vendo o Judiciário reconhecer o dano ocasionado pelo comportamento do representante do Ministério Público. Foi o reconhecimento civil de responsabilidade do Estado através do comportamento do do Ministério Público”, comemorou o senador.

O promotor já havia sido penalizado administrativamente a cinco dias de suspensão pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em processo movido também por Contarato pelo mesmo motivo. Em processos de adoção, a manifestação do representante do Ministério Público é obrigatória. Segundo o senador, no processo de adoção de seu filho, o promotor estadual, além de resistir ao andamento do caso, alegou que não haveria “autorização legal para que um ser humano venha a ter dois pais, como pretendido, ou, pior ainda, duas mães”.

A manifestação do promotor confrontou decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal no sentido de reconhecer idênticos direitos e obrigações familiares aos casais homoafetivos. “Não queremos nem um direito nem a mais, nem a menos. Queremos apenas ser respeitados como todas as pessoas o são. Queremos apenas o direito de viver, ter uma família”, afirmou o senador.

Para o senador, a decisão da Justiça do Espírito Santo servirá de exemplo para evitar que práticas discriminatórias análogas vitimem outros casais LGBTQIA+ em processos de adoção e mostrará ao seu filho o quanto os seus dois pais lutaram por sua adoção “de forma digna, reagindo à tentativa de apagamento da nossa família”.

Contarato e Rodrigo são pais de um menino, Gabriel, e de uma menina, Mariana. Em discurso feito no Prêmio Congresso em Foco, em 2021, ao ser reconhecido como um dos melhores senadores do ano, o petista fez um discurso emocionado em defesa da democracia e dedicou a conquista à sua família.  “Eu vou morrer defendendo a democracia. Mas também não poderia deixar de agradecer as pessoas que são mais importantes pra mim. Família é onde semeia o amor, não tem orientação sexual, não tem cor da pele”. Confira o discurso:

Fonte: Congresso em Foco.

Vale a pena lembrar de outros casos de condenação similares:

Corpo de jovem é encontrado carbonizado, na Grande SP; amigos suspeitam de crime de homofobia

Casos assim são inaceitáveis! Temos que fazer valer a decisão do STF sobre criminalização da LGBT+fobia:

Yago Henrique França, de 29 anos, estava desaparecido desde o dia 27 de fevereiro e foi encontrado na noite desta terça-feira (8), pela Polícia Civil. Segundo a SSP, o caso foi registrado como morte suspeita pela Delegacia de Itapecerica da Serra, que solicitou perícia e exame necroscópico à vítima.


Yago Henrique França, de 29 anos, estava desaparecido desde o dia 27 de fevereiro — Foto: Reprodução/Redes Sociais

Yago Henrique França, de 29 anos, estava desaparecido desde o dia 27 de fevereiro — Foto: Reprodução/Redes Sociais

A Polícia Civil encontrou o corpo de um jovem carbonizado na noite desta terça-feira (7), em Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo. O caso é investigado como “morte suspeita”.

A suspeita de amigos é que o crime tenha sido cometido por homofobia. Eles também pedem por justiça.

Yago Henrique França, de 29 anos, que estava desaparecido desde o dia 27 de fevereiro, teve seu corpo identificado pela mãe no IML de Taboão da Serra.

Yago era ator e tarólogo. Segundo amigos da vítima, ele teria marcado um encontro por aplicativo e não teria sido mais visto.

Até o momento, nenhum suspeito foi preso ou localizado.

Jovem é encontrado morto em Itapecerica da Serra, na grande SP

Por meio de nota, a Secretaria de Segurança Pública informou que o crime será investigado pelo Setor de Homicídios e Proteção à Pessoa – SHPP de Taboão da Serra por meio de inquérito policial para apurar todas as circunstâncias relacionadas aos fatos.

Ainda de acordo com a SSP, “o caso foi registrado como morte suspeita pela Delegacia de Itapecerica da Serra, que solicitou perícia e exame necroscópico à vítima.”

Em 2021 Yago chegou a participar do concurso Drag Nights, performando como a drag Amélia Lovett (veja foto abaixo).

Yago França no concurso Drag Nights, em 2021, performando como a drag Amélia Lovett — Foto: Celso Tavares/g1

Yago França no concurso Drag Nights, em 2021, performando como a drag Amélia Lovett — Foto: Celso Tavares/g1

Fonte: G1.

Trabalho Escravo: Aberto Processo de Cassação de Vereador do RS que falou contra baianos

Câmara de Vereadores de Caxias do Sul aceita pedido de cassação de vereador que discursou contra baianos

Comissão parlamentar processante composta por 3 vereadores vai analisar a cassação. Sandro Fantinel pediu que ‘empresas não contratem mais aquela gente lá de cima’, em referência a baianos, após saber de trabalhadores resgatados em condições de escravidão.


Vereador Sandro Fantinel em sessão na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul em maio de 2022 — Foto: Manuelli Boschetti/Divulgação

Vereador Sandro Fantinel em sessão na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul em maio de 2022 — Foto: Manuelli Boschetti/Divulgação

A Câmara de Vereadores de Caxias do Sul aceitou por unanimidade os pedidos de cassação do vereador Sandro Fantinel (sem partido), em sessão ordinária realizada na manhã desta quinta-feira (2). Com o acolhimento, foi criada uma comissão parlamentar processante para avaliar a cassação. O grupo tem 90 dias para a decisão.

RBS TV tentou contato com o vereador Sandro Fantinel, mas até a última atualização desta reportagem, não havia obtido retorno.

Quatro pedidos de cassação foram abertos e analisados nesta quinta. Os vereadores votaram todos juntos e uma única vez.

Na terça-feira (28), Fantinel usou a tribuna da Câmara de Vereadores para pedir que os produtores da região “não contratem mais aquela gente lá de cima”, se referindo a trabalhadores vindos da Bahia. A maioria dos trabalhadores contratados para a colheita da uva veio do estado nordestino.

O vereador se referia aos mais de 200 homens encontrados em situação semelhante à escravidão em um alojamento de Bento Gonçalves.

Fantinel foi expulso do Patriota nesta quarta-feira (1º). Um boletim de ocorrência contra ele foi registrado pelo deputado estadual Leonel Radde (PT) na terça (28). O Ministério Público do Trabalho (MPT) do RS também anunciou que investigará o parlamentar por apologia ao trabalho escravo.

Vereador de Caxias do Sul diz para vinícolas não contratarem baianos

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Integrantes da comissão processante

  • Tatiane Frizzo (PSDB);
  • Felipe Gremelmaier (MDB);
  • Edi Carlos Pereira de Souza (PSB).
Sessão na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul aceita pedido de cassação de vereador Fantinel (sem partido). — Foto: Leonardo Portella/RBS TV

Sessão na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul aceita pedido de cassação de vereador Fantinel (sem partido). — Foto: Leonardo Portella/RBS TV

Pedidos

O primeiro pedido de cassação contra Fantinel foi feito pelo ex-vice-prefeito de Caxias do Sul, Ricardo Fabris de Abreu, na manhã de quarta (1º).

No pedido, Fabris diz que “Caxias do Sul e o Rio Grande do Sul são agora vergonha nacional, acusados de serem locais racistas, extremistas e xenófobos”. Ele ainda afirma que o vereador transformou a Câmara de Vereadores em “uma câmara dos horrores, com a tribuna servindo de picadeiro”.

As Defensorias do Estado do Rio Grande do Sul e da Bahia também pediram a cassação do mandato do vereador.

No documento, os defensores pedem que “seja determinada a notificação do vereador para que apresente sua defesa e que, ao final, após análise do mérito, seja determinada a cassação do mandato, ante a conduta configuradora de violação do decoro parlamentar e tipificada como crime de racismo na Lei federal nº 7.716/89, bem como, nos termos da legislação vigente pertinente”.

Investigação

O Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) abriu, de ofício, investigação contra o vereador por apologia ao trabalho escravo. De acordo com o órgão, Fantinel “culpabilizou as vítimas pela situação, além de promover xenofobia contra trabalhadores baianos” em seu discurso.

Para o procurador e vice-coordenador nacional de erradicação do trabalho escravo no MPT, Italvar Medina, “a fala minimiza, indevidamente, a extrema gravidade da escravidão contemporânea, busca culpabilizar as próprias vítimas pelos ilícitos sofridos, tem conteúdo preconceituoso e, para piorar, estimula a discriminação nas relações de trabalho, em ofensa à Constituição da República, à legislação e a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil”.

Declarações

Durante a fala na tribuna da Câmara de Vereadores, Fantinel sugeriu também que se dê preferência a empregados vindos da Argentina, que, segundo ele, seriam “limpos, trabalhadores e corretos”.

Após o discurso, o vereador afirmou ao g1 que só falou da Bahia “porque é a Bahia que tá envolvida no processo de Bento Gonçalves, se fosse Santa Catarina, eu teria falado Santa Catarina”. Ele acrescentou que se arrepende de ter dito que “a única cultura que os baianos têm é viver na praia tocando tambor”.

O vereador voltou a falar sobre o discurso à equipe da RBS TV, na manhã desta quarta (1º).

“A intenção da pauta na tribuna, ontem, era querer transmitir para os agricultores terem um certo cuidado. Porque existem alguns grupos que estão dando golpes usando a questão da analogia à escravidão. […] Quando a gente está no calor da fala, […] a gente diz palavras que não é o que a gente quer dizer, que não representa a gente”, afirmou.

“A única coisa que eu disse dos baianos é que eles gostam só de tocar tambor e ficar na praia né. Se a gente fosse ter essa conversa em um outro momento, a pessoa iria dizer: ‘ah, é verdade. É a cultura deles, não tem nada de mal’. O problema é que entrou em um contexto que foi interpretado como forma de falar mal deles”, disse.

Repercussão

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, condenou, através das redes sociais, a fala do vereador Sandro Fantinel. A posição de Leite foi contra o “discurso xenófobo e nojento” do parlamentar.

“Não representa o povo do Rio Grande do Sul. Não admitiremos esse ódio, intolerância e desrespeito na política e na sociedade. Os gaúchos estão de braços abertos para todos, sempre”, disse.

O governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT), também se manifestou no Twitter:

As declarações do vereador também provocaram respostas de seus colegas de Câmara em Caxias do Sul. Lucas Caregnato (PT) disse que as palavras usadas foram de “cunho xenofóbico, preconceituoso e discriminatório”.

Rafael Bueno (PDT) pediu que a Câmara emita uma nota “pedindo desculpas, porque a gente não comunga com qualquer prática de intolerância, seja com imigrantes ou trabalhadores que procuram nossa região para sobreviver”.

Fonte: G1

STF decidiu: Inconstitucional Lei que Proíbe uso de “linguagem neutra” nas escolas – ADI 7.019 

Como discutimos aqui:

Proibição do uso de “linguagem neutra” nas escolas e em editais de concursos públicos – ADI 7.019/RO

Tese fixada:

Norma estadual que, a pretexto de proteger os estudantes, proíbe modalidade de uso da língua portuguesa viola a competência legislativa da União.

Resumo:

É inconstitucional — por violar a competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional (CF/1988, art. 22, XXIV) — lei estadual que veda a adoção da “linguagem neutra” na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas e privadas, assim como em editais de concursos públicos locais.

Embora os estados possuam competência para legislar concorrentemente sobre educação, devem observar as normas gerais editadas pela União (CF/1988, art. 24, IX).

Nesse contexto, a União editou, no exercício de sua competência nacional, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996), cujo sentido engloba as regras que tratam de currículos, conteúdos programáticos, metodologia de ensino ou modo de exercício da atividade docente (1). Portanto, no âmbito da competência concorrente, a União fixa as regras minimamente homogêneas em todo território nacional (2).

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade formal da Lei 5.123/2021 do Estado de Rondônia (3).

(1) Precedente citado: ADPF 457.

(2) Lei 9.394/1996: “Art. 9º A União incumbir-se-á de: (…) IV – estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum;”

(3) Lei 5.123/2021 do Estado de Rondônia: “Art. 1º Fica garantido aos estudantes do Estado de Rondônia o direito ao aprendizado da língua portuguesa de acordo com a norma culta e orientações legais de ensino estabelecidas com base nas orientações nacionais de Educação, pelo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VolP) e da gramática elaborada nos termos da reforma ortográfica ratificada pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP. Art. 2º O disposto no artigo anterior aplica-se a toda Educação Básica no Estado de Rondônia, nos termos da Lei Federal nº 9.394/96, assim como aos Concursos Públicos para acesso aos cargos e funções públicas do Estado de Rondônia. Art. 3º Fica expressamente proibida a denominada ‘linguagem neutra’ na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas ou privadas, assim como em editais de concursos públicos. Art. 4º A violação do direito do estudante estabelecido no artigo 1º desta Lei acarretará sanções às instituições de ensino privadas e aos profissionais de educação que concorrerem ministrar conteúdos adversos aos estudantes, prejudicando direta ou indiretamente seu aprendizado à língua portuguesa culta. Art. 5º As Secretarias responsáveis pelo ensino básico do Estado de Rondônia deverão empreender todos os meios necessários para a valorização da língua portuguesa culta em suas políticas educacionais, fomentando iniciativas de defesa aos estudantes na aplicação de qualquer aprendizado destoante das normas e orientações legais de ensino. Art. 6º Fica o Poder Executivo autorizado a firmar convênio com instituições públicas e privadas voltadas à valorização da língua portuguesa no Estado de Rondônia. Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

ADI 7.019/RO, relator Ministro Edson Fachin, julgamento virtual finalizado em 10.2.2023 (sexta-feira), às 23:59

 

Entrevista: No Brasil 256 pessoas morreram por se reconhecerem pessoas LGBTQIAPN+

Reportagem:

No Brasil 256 pessoas morreram por se reconhecerem pessoas LGBTQIAPN+

Os homens gays representam mais da metade das vítimas

Publicado em 22/01/2023 – 08:30 Por Victor Ribeiro – Repórter da Rádio Nacional – Brasília

O Brasil manteve, no ano passado, a liderança entre os países onde mais morrem pessoas LGBTQIAPN+. É a parcela da população formada por lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer, intersexo, assexuais, pansexuais, não-bináries e outras. Ao longo de 2022, 256 pessoas morreram apenas por se reconhecerem em alguma dessas letras.

Dessas, 242 foram assassinadas e outras 14 tiraram a própria vida. É uma morte a cada 34 horas. O levantamento é feito há 43 anos pelo Grupo Gay da Bahia, a partir de notícias publicadas nos meios de comunicação.

Os homens gays representam mais da metade das vítimas. São 134 mortes entre esse público. Ayrton Sabino é um sobrevivente. Ele já foi agredido fisicamente duas vezes por ser gay e se decepcionou ao procurar a polícia.

Em números absolutos, a Bahia foi o estado mais perigoso, com 27 mortes causadas por LGBTfobia. Já quando a comparação é feita com o total da população, Alagoas é o estado com a maior taxa de vítimas. Somente dois estados não tiveram mortes por esse motivo no ano passado: Acre e Tocantins.

O Grupo Gay da Bahia mapeou vítimas em 155 municípios.

Quatro anos atrás, o Supremo Tribunal Federal criminalizou a LGBTfobia no Brasil. A maioria dos ministros decidiu que o Congresso Nacional tem sido omisso ao não votar projetos que tramitam há mais de 20 anos. Até que os parlamentares criem leis específicas, o STF determinou que os casos de LGBTfobia fossem tratados como crimes de racismo.

O advogado Alexandre Bahia é professor da Universidade Federal de Ouro Preto e vice-presidente da Comissão de Diversidade da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais. Ele foi um dos profissionais que atuou no julgamento no STF e ressalta que a criminalização da LGBTfobia ajuda a proteger toda a sociedade.

Alexandre Bahia lembra de situações em que até familiares foram alvos desse tipo de violência ao trocarem afeto publicamente.

O advogado e professor Alexandre Bahia avaliou que o combate à LGBTfobia ainda é lento. Apesar de o julgamento no Supremo Tribunal Federal ter quatro anos, só agora começaram a ocorrer as primeiras condenações baseadas na decisão. No Congresso, um dos projetos de lei ganhou força, mas, de acordo com ele, ainda não foi suficiente para ser votado e dar origem a uma lei.

*Com produção de Dayana Vítor e Michelle Moreira

Fonte: RadioAgência Nacional.

Dica de Leitura: “Minha corpa é voz de afeto: a cisheteronormatividade encarnada na cidade e o direito como impedimento para o fim do mundo”

Acaba de ser publicado o e-book: “Minha corpa é voz de afeto: a cisheteronormatividade encarnada na cidade e o direito como impedimento para o fim do mundo“.

A obra é resultado da Dissertação de Mestrado de Ge Mello – Pessoa trans não-binária, mestre em direito pelo programa Novos Direitos e Novos Sujeitos da UFOP, com especialização em Cidadania e Direitos Humanos no contexto de políticas públicas na PUC-Minas e graduação em Direito pela PUC-Rio.

Existências dissidentes incomodam, porque geram danos. E é
assim que é a escrita de Gê. Uma escrita corajosa. Articulando
dimensões opressivas do cistema, Gê não tem medo de tocar nas feridas ontológicas e epistêmicas das teorias jurídicas, penetrando nas entranhas do corpo normalizado do sujeito de direitos. Um corpo branco-binário, que performa a ficção da neutralidade da norma determinada pelo colonizador.

Trecho do Prefácio da Profa. Flávia Máximo.

O e-book pode ser baixado, gratuitamente, aqui.

Massacre na Escola de Aracruz mostra que o país está doente

Precisamos falar sobre o ódio que se espalha pelo Brasil.

Professora da rede pública do Espírito Santo, Maria da Penha Banhos, a Peinha, encheu as paredes da escola Primo Bitti de poesias. Queria dar aos alunos daquele colégio de Aracruz um pouco do amor com que criou os três filhos. A professora Cybelle Bezerra, sua colega, veio de Pernambuco cinco meses atrás para ensinar os meninos e meninas capixabas. 

Flavia Amoss Merçon Leonardo, a outra professora, tentava fazer um Brasil melhor também fora da escola. Morava na região da nascente do rio Doce, que foi afetada gravemente pela tragédia da Vale em Mariana (MG). Passou a integrar o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) para garantir direitos aos moradores. Selena Sagrillo tinha apenas 12 anos. Poderia ser professora, médica, bailarina. 

Na sexta-feira (25 de novembro) a jornada dessas três mulheres e da pequena Selena foi brutalmente interrompida. A mãe de Selena, Thais, emocionou todo o país quando resumiu o que aconteceu. “A minha filha sempre foi luz e amor; e eu perdi a minha filha para o ódio.”

O adolescente de 16 anos responsável pelo massacre de Aracruz foi detido em sua casa. Confirmou, friamente diante dos pais, as acusações da polícia. Na sexta-feira, ele vestiu um uniforme camuflado, em que costurou uma suástica, símbolo nazista. Pegou duas armas e o carro do pai, um policial militar, e seguiu para o crime planejado. Ex-aluno da Primo Bitti, entrou na sala de professores e atirou a esmo. Disse ao delegado que não tinha um alvo fixo.

Thaís Pessoti, de 14 anos, foi baleada por atirador em Aracruz e está na UTI
Thaís Pessoti, de 14 anos, foi baleada por atirador em Aracruz e está na UTIFoto: Reprodução/internet

O nazista agiu assim: apenas com muito ódio pelo mundo. Seguiu da Primo Bitti para outra escola, o Centro Educacional Praia do Coqueiral, onde acabou com a vida de Selena. Naquele colégio ele acertou outra menina, de 14 anos, que até a noite desta segunda-feira lutava para sobreviver: Thaís Pessoti da Silva, cuja imagem ilustra este artigo, internada na UTI de um hospital local em estado gravíssimo. 

Na semana passada, o Terra divulgou com exclusividade um relatório que mostra o crescimento assustador do nazismo na internet brasileira. Em apenas um ano, o número de células de grupos de ódio mais que dobrou. São 1.117 células, atingindo quase 300 municípios, segundo a pesquisadora Adriana Dias (Fiocruz).

Nos aplicativos de mensagens, como Telegram, proliferam arquivos com literatura nazista. Há alguns dias, um desses grupos nazistas foi desbaratado em Santa Catarina. Um dos presos já usava tornozeleira eletrônica por ser acusado da morte de um judeu. Responder a processo por homicídio não foi impedimento para que cometesse o crime de apologia ao nazismo. É característica desses grupos não só a violência, mas a certeza de impunidade.

Esse discurso de ódio alimenta grupos organizados e os chamados lobos solitários, pessoas que, individualmente, decidem promover ataques e massacres. Ainda não se sabe se o adolescente de Aracruz agiu como um lobo solitário. É cedo para descartar qualquer hipótese. A única certeza é a de que o ódio matou Selena, Peinha, Flávia e Cybelle. Quatro mulheres. O ódio a mulheres, aliás, é também uma característica desses movimentos.

O Brasil, nos últimos anos, passou a colecionar esses atentados em escolas. Há 12 anos, um ex-aluno matou 12 crianças e adolescentes de uma escola de Realengo, no Rio. Das 12 vítimas, 10 eram mulheres. Os alunos contaram que o atirador mirava na cabeça delas e no corpo dos meninos.

Em 2019, em Suzano (SP), dois jovens entraram em uma escola e mataram sete pessoas com faca, arma de fogo e até um equipamento de arco e flecha. Antes, haviam matado o tio de um deles. Foram cinco meninos de no máximo 15 anos e duas funcionárias da escola. A dupla se suicidou quando foi cercada pela polícia.

Só este ano, foram outros dois ataques em escolas. Um em Barreiras (BA), onde o atirador matou uma menina, e outro em Sobral (CE), em que a arma usada pelo adolescente que cometeu o crime estava registrada em nome de um CAC (Caçadores, Atiradores e Colecionadores). Em julho passado, o número de armas nas mãos de CAC chegou a 1 milhão, quase o dobro do que era registrado em 2018, antes do governo Bolsonaro.

Não se pode mais tratar cada atentado em escola como se fosse um caso aleatório. É uma doença que tem se espalhado, alimentada pelo discurso de ódio, pela violência política e pelo culto às armas. O Brasil tem colocado muitas sujeiras debaixo do tapete: violência de gênero, racismo, violações de toda natureza aos preceitos da democracia. Não pode camuflar mais essa chaga. É como diz um ditado americano de mais de século: a luz do sol é o melhor desinfetante.

Fonte: Terra.